El hoyo ("A plataforma")


A cercado que durante anos isolou a luta de classes das várias expressões artísticas com ampla difusão quebrou-se. O cinema destinado a suportes e canais de distribuição de massa não se manteve à margem desta nova realidade e em poucos anos produziu e distribuiu vários filmes que de uma forma ou de outra tratam os conflitos sociais decorrentes da estrutura altamente hierarquizada da sociedade capitalista.
A chegada de "El hoyo" ("A plataforma") à plataforma de streaming Netflix é apenas mais um exemplo da forma como a arte que expressa a violência das diferenças sociais existentes se assume como produto de consumo vendável. O filme basco parece uma revisitação do conceito de organização linear da sociedade explorado há uns anos pelo coreano Bong Joon-ho em "Snowpiercer" (2013), película que em vez de um buraco utilizou a imagem de um longo comboio como metáfora da organização social hierarquizada.
O diálogo filosófico entre Goreng e Trimagasi, na primeira cena de "El hoyo", é muito provavelmente o segmento mais interessante de toda a história. Trimagasi é "veterano" do buraco, Goreng acaba de chegar voluntariamente, ignorante acerca da comunidade que passa a integrar. Trimagasi esclarece-o acerca de aspectos "óbvios" da relação que deverão estabelecer com os de cima e com os de baixo. Os do meio... caem.
A queda é a tendência geral das camadas intermédias das comunidades humanas submetidas a regimes políticos marcados pela hierarquia de poder (político e económico), efeito da gravidade social que parece ser "lei" incontornável num contexto em que a "solidariedade espontânea" não passa de uma quimera. "El hoyo" procura ilustrá-lo, por vezes deixando de lado a história em si, e isso creio que a penaliza gravemente.
Fica todavia um contributo assinalável do cinema espanhol, por vezes demasiado "gráfico", para a queda do tabu relativo às contradições estruturais entre classes em sociedades estruturadas em camadas sobrepostas de poder político, económico e social.



Comentários

Mensagens populares deste blogue

17-0, ou como Mourinho se estreou no Belenenses

A segunda morte do Estrela da Amadora

Assembleia Geral Eleitoral 2020: Porque voto A?