Os 10%: um assunto encerrado no plano associativo

A tese segundo a qual o Belenenses terá perdido um valor próximo de meio milhão de euros ao vender as suas ações na B-SAD não tem sustentação na realidade dos factos nem nas circunstâncias de uma sociedade anónima cujas condições de viabilidade se degradam de dia para dia.
É bom que ninguém esqueça que em 2012 o actual dono da B-SAD comprou posição maioritária na sociedade por cerca de 500 euros. Naturalmente que o valor teve em atenção a situação financeira da sociedade, à data com um passivo de cerca de 7 milhões de euros, número avançado pelo "investidor" em entrevista à BolaTV, em Fevereiro de 2013.
Seis anos depois, em 2019, o passivo da sociedade ultrapassava já 11 milhões de euros, 4 milhões a mais face ao momento da compra de 51% da sociedade por parte da Codecity Sports Management. Ou seja, o passivo da B-SAD é hoje muito superior ao passivo da "Os Belenenses Futebol SAD" à data da venda da maioria do capital social da sociedade, entre o final de 2012 e o início de 2013.
De lá para cá a B-SAD perdeu o direito de disputar os seus jogos no Estádio do Restelo. Perdeu a grande maioria dos adeptos que acompanhavam, e até determinado momento apoiavam, a sua equipa. Perdeu a ligação ao associativismo que é a génese e a natureza fundamental do clube. Perdeu a ligação à comunidade local, e a ligação aos escalões de formação do futebol do Belenenses.
Por outro lado, os actuais donos ganharam uma liberdade quase ilimitada na gestão da sociedade que de resto não conta com um membro designado pelo clube desde há longa data.
Um comunicado da CMVM acerca de uma avaliação realizada sobre contrapartidas mínimas para a OPA da "Os Belenenses – Sociedade Desportiva de Futebol, SAD", em 2014, referia que "qualquer valor acima de 0€ está acima do justo valor de mercado da Belenenses SAD à data de 31 de Dezembro de 2012".
Sendo certo que face a 31/12/2012 se verificou um acontecimento desportiva e financeiramente relevante - a subida de divisão da equipa à data do Belenenses da 2ª para a 1ª Liga - não é menos verdade que todos os restantes aspectos da vida da sociedade se degradaram e agravaram radicalmente, incluindo no plano da imagem pública dos seus donos e da respectiva gestão.
Um valor de 1.000,00€ por pouco mais de 10% da acções da sociedade parece-me "negócio" francamente vantajoso para o Belenenses.
Muitos dirão que o negócio é nulo, apontado para o ponto 1 do artigo 23º da chamada lei das SAD. Curiosamente poucos referem o ponto 2 do artigo 14º da mesmíssima lei ("As ações das sociedades anónimas desportivas não podem ser objeto de limitações à respetiva transmissibilidade").
A questão é jurídica, mas não é apenas jurídica. Porque há nela uma dimensão política e associativa que a B-SAD e os seus clientes teimam em ignorar: desde há vários anos que todas - sublinho: todas - as Assembleias Gerais de Associados do Belenenses se manifestam pelo corte definitivo do Belenenses com a sociedade de que foi fundador, mas à qual não quer pertencer nem na qual quer participar.
Não existem quaisquer condições para um hipotético - e na prática impossível - regresso da B-SAD e das suas equipas (parte das quais são adversárias das equipas do Belenenses). De resto a B-SAD anunciou já a intenção de criar equipas noutras modalidades - no Futsal, nomeadamente -, acrescentando razões às razões que levam os sócios do Belenenses a encará-la com uma entidade adversária.
O assunto está encerrado no plano associativo. Desenterrá-lo só vai agravar tensões e agravar a repulsa que boa parte dos belenenses sentem pelo emblema em causa.

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